Por Patricia Punder, advogada e CEO da Punder Advogados Marcelo Alambert, engenheiro agrônomo
A mudança climática é um tema controverso, quando pesquisamos em portais de busca, as análises dos pesquisadores atribuem como causa do efeito estufa a ação humana, despejando CO2, metano, óxidos de nitrogênio e CFCs na atmosfera.
As mudanças climáticas são uma realidade inegável e já sentimos os efeitos em nosso dia a dia. Segundo o portal Greenpeace Brasil, “o clima não espera: cientistas do IPCC alertam que combater o aquecimento global exige mudanças sem precedentes, mas ainda é possível se não perdermos tempo; e nossas florestas são motivo para ter esperança”.
A certeza que todos nós temos, a olho nu, é que temperatura média do planeta está subindo, poucos graus podem causar mudanças significativas, como as secas severas que ocorreram neste ano na Europa e China, e as enchentes no sul e sudoeste da Ásia, que segundo os portais de notícias globais, causaram mortes, desabrigaram milhões de pessoas, destruiram plantações, rodovias e ferrovias, e mataram gado.
Em 2021, as notícias eram que enchentes ocorreram na Alemanha, Bélgica e Holanda. Em 2022, acompanhamos as fortes queimadas na Europa e em regiões dos Estados Unidos. Outros eventos extremos como tufões, furacões e tornados, também estão cada vez mais frequentes.
Além dos danos materiais e humanos diretos, há um risco indireto menos perceptível e mais frequente: as plantas que nos alimentam. Para o desenvolvimento das lavouras, a água é o insumo fundamental, na quantidade e no momento certo. A exigência de água não é igual dentro do ciclo de vida das plantas, é menor na germinação e no início do desenvolvimento e maior no enchimento dos grãos ou na formação de tubérculos e frutos. O que deve-se frisar é que a falta de água durante o desenvolvimento das plantas é muito mais comum e impactante que os eventos extremos provocados pelo aumento da temperatura. A deficiência hídrica impede a total expressão do potencial produtivo das lavouras, resultando em perdas de produtividade e, por vezes, no total fracasso da produção.
Um dos exemplos que podemos citar é o milho, a segunda cultura com o maior potencial de transformar energia solar em alimento, motivo de seu cultivo ser distribuído por quase todo o globo. A despeito de seu enorme potencial produtivo, um déficit hídrico de 15 a 20 dias em um momento crucial de seu desenvolvimento pode levar à perda total da lavoura, e a seca que ocorreu na Europa, China, Argentina, Uruguai, Paraguai e sul do Brasil nesse ano provou isso. Por sorte do Brasil, segundo o portal Conab, a estimativa para a temporada 2022/23 é de 28,69 milhões de toneladas, este resultado se deve a perspectiva de recuperação da produtividade no atual ciclo.
No caso da soja, grão que tem período de cultivo bastante delimitado, seu uso vai além da alimentação de frangos, aves poedeiras, suínos e gado leiteiro, o mercado depende da oferta do grão. Conforme o portal SEFAZ, apenas quatro países representam 90% da produção global de soja, estes sendo Brasil, Argentina, Paraguai e Estados Unidos, ou seja, qualquer intercorrência na produção desses países afeta a oferta de proteína animal na dieta de bilhões de pessoas. Segundo o portal FarmNews, nos últimos 4 anos, o consumo mundial passou de 340 milhões de toneladas para 380 milhões de toneladas, porém o estoque final desta oleaginosa mantém-se em torno de 100 milhões de toneladas na média dos últimos anos.
Ademais, os eventos extremos não só podem causar a falta de alimentos, mas também afetar a logística de transporte. Portais, como G1 e o StoneX, mostraram como as secas severas na Europa e Estados Unidos reduziram a vazão de rios importantes para a navegação, como o Rio Reno, na Alamenha, o Rio Danúbio, na Bulgária, e o Rio Mississipi, nos Estados Unidos. Importante salientar que a via fluvial tem o menor custo por tonelada transportada e outras alternativas encarecem o preço dos alimentos até o ponto de ser inviável o escoamento das safras, o que torna preocupante o transporte dos grãos para região do Golfo por conta da menor vazão do rio Mississipi, onde se concentra a maior parte das exportações de soja e milho dos Estados Unidos. Tufões também prejudicam cidades portuárias importantes para o escoamento de alimentos.
As preocupações com as mudanças climáticas e a escassez de água e alimentos são fatos incontestáveis, e ainda estamos discutindo o que cada país deve fazer para contribuir para evitar o caos futuro. Infelizmente, a COP27 foi finalizada com muitas promessas, mas poucas ações. Os países ricos têm uma responsabilidade pelo que aconteceu no mundo, afinal, destruíram suas florestas, iniciaram um processo de industrialização desenfreado e hoje gozam de uma condição financeira per capita muito melhor que os países em desenvolvimento. Este crescimento tem um preço a ser pago, seja através de compensações financeiras ou de programas de desenvolvimento de economias “eco-friendly”.
Indispensável frisar que temperaturas elevadas, eventos climáticos extremos e interrupções nas cadeias de fornecimento de alimentos, água e energia, podem causar aos cidadãos dos países subdesenvolvidos uma dura realidade, prejudicando sua saúde e seu financeiro. A fome já existe causada pela desigualdade social nos países, mas se a escassez de alimentos entrar em um novo panorama: os países que irão poder comprar alimentos contra os países que não terão condições de alimentar sua população, o problema não será mais individual – de cada um dos países – mas de blocos econômicos com condições muito dispares no poder aquisitivo e força política.
Para começar, podemos trabalhar com formuladores de políticas globais para melhorar a política fiscal em torno de alimentos. De acordo com o The Nature Conservancy, governos em todo o mundo gastam até US$ 500 bilhões por ano em subsídios agrícolas, florestais e de pesca que degradam a natureza, quantia que é mais do que o dobro do que gastam para proteger ou restaurar a natureza.
A necessidade por alimentos não está desaparecendo ou diminuindo, está crescendo, e a maneira como, atualmente, cultivamos alimentos está degradando o planeta de uma forma que, paradoxalmente, torna o cultivo de alimentos cada vez mais difícil. Um sistema alimentar regenerativo é nossa melhor opção, não apenas para proteger a natureza, mas para garantir que a vida humana sobreviva e prospere. Juntos, podemos transformar a maior ameaça atual à natureza em sua maior oportunidade de ter um sistema alimentar que traga um crescimento positivo para as comunidades, economias e o planeta.
Patricia Punder, advogada é compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020.
Com sólida experiência no Brasil e na América Latina, Patricia tem expertise na implementação de Programas de Governança e Compliance, LGPD, ESG, treinamentos; análise estratégica de avaliação e gestão de riscos, gestão na condução de crises de reputação corporativa e investigações envolvendo o DOJ (Department of Justice), SEC (Securities and Exchange Comission), AGU, CADE e TCU (Brasil).
Marcelo Alambert, engenheiro agrônomo, com carreira profissional desenvolvida no Setor de Agronegócios TÉCNICO-COMERCIAL trabalhando para EMPRESAS DO AGRONEGÓCIO internacionais. Líder de projetos de pesquisa e desenvolvimento de produtos em uma ampla variedade de plantações, como soja, milho, algodão, feijão, arroz, citros, café e cana-de-açúcar. Responsável por otimizar o custo/benefício dos recursos do agronegócio.
Com sólida experiência em todas as etapas do processo de desenvolvimento de produtos de pesquisa agroindustrial. Responsável pela gestão de importantes áreas do agronegócio no território brasileiro. Forte relacionamento com Escritórios de Pesquisa Governamentais Brasileiros (EMBRAPA, UNESP, USP, IAPAR), e Instituições Privadas relacionadas. Gerenciamento de projetos para acordos técnicos e comerciais e desenvolvimento de novos produtos agroindustriais.