A Mata Atlântica, bioma mais devastado do país, perdeu o equivalente a 18 mil campos de futebol entre 2019 e 2020, como mostram os dados do Atlas da Mata Atlântica divulgados nesta quarta-feira (26).
Entre 2019 e 2020, o desmatamento da Mata Atlântica se intensificou em dez dos 17 estados que compreendem o bioma: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Ceará, Alagoas, Rio Grande do Norte, Goiás, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Espírito Santo. Nos quatro últimos (RJ, MS, SP e ES), o aumento foi de mais de 100% em relação ao período anterior – sendo que em São Paulo e no Espírito Santo este ultrapassou 400%. A manutenção do alto patamar de perda da vegetação nativa, com o crescimento do desmatamento em diversos estados, ameaça intensamente o bioma e reforça a necessidade de ações de preservação e restauração florestal.
As informações são do Atlas da Mata Atlântica, estudo realizado desde 1989 pela Fundação SOS Mata Atlântica em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, unidade vinculada ao Ministério de Ciência Tecnologia e Inovação (INPE/MCTI), lançado na quarta-feira, 26 de maio, véspera da data em que é celebrado o Dia Nacional da Mata Atlântica (27/5). A execução técnica ficou a cargo da Arcplan.
No total, foram desflorestados 13.053 hectares (130 quilômetros quadrados) da Mata Atlântica no período – dado que, apesar de 9% menor que o levantado em 2018-2019 (14.375 hectares), representa um crescimento de 14% em relação a 2017-2018 (11.399 hectares), quando se atingiu o menor valor da série histórica.
Os três estados que mais desmataram no período anterior seguem no topo do ranking, embora mostrem ligeiras reduções em seus índices: Minas Gerais (de 4.972 para 4.701 hectares), Bahia (de 3.532 para 3.230 hectares) e Paraná (de 2.767 para 2.151 hectares). Junto de Santa Catarina e do Mato Grosso do Sul, respectivamente o quarto e o quinto da lista, eles acumulam 91% da perda de vegetação da Mata Atlântica entre 2019 e 2020.
“Mesmo que tenhamos uma diminuição de 9% do desmatamento em relação a 2018-2019, ali o aumento havia sido de 30%, então não podemos falar em tendência de queda”, explica Luís Fernando Guedes Pinto, diretor de Conhecimento da Fundação SOS Mata Atlântica. “Além disso, no que se refere à Mata Atlântica, 13 mil hectares é muito, porque se trata de uma área onde qualquer perda impacta imensamente a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos, como regulação do clima e disponibilidade e qualidade da água”, afirma.
Segundo ele, a grande preocupação é ver estados que já estiveram muito próximos de zerar o desflorestamento voltando a mostrar aumentos expressivos. “São Paulo e Espírito Santo são os maiores exemplos disso”, completa.
Oito dos 17 estados aparecem nessa condição próxima ao desmatamento zero, ou seja, menor de 100 hectares. Alagoas, Ceará, Goiás, Espírito Santo, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte. No período de 2017-2018 e de 2018-2019, nove estados apareciam com menos de 100 hectares desflorestados.
Enquanto nos estados que abrangem a maior parcela de desmatamento do bioma no país a ocupação agrícola pode ser apontada como principal vetor, em regiões como as de São Paulo e do Rio de Janeiro, onde, proporcionalmente, o desmatamento se mostrou muito acentuado, a pressão está no entorno das áreas metropolitanas e no litoral – ocorrendo, acima de tudo, por conta da expansão imobiliária e pelo turismo.
Para Luís Fernando, o principal problema é a falta de fiscalização. “Os governos precisam fazer valer a Lei da Mata Atlântica, que não permite a conversão de áreas florestais avançadas, e garantir o desmatamento ilegal zero por meio do combate às derrubadas não autorizadas”, explica.
Um estado que chama a atenção é o Piauí, que teve uma queda drástica no desmatamento neste último período. Entre 2017-2018 aparecia no quarto lugar da lista, com 2.100 hectares, no período 2018-2019 foram desflorestados 1.558 hectares e neste último período, apenas 372 hectares,76% de redução, caso a ser comemorado.
Desflorestamento (dec) da Mata Atlântica identificados no período 2019-2020 em comparação ao período anterior (em hectare):
UF | Área UF | UF na Lei MA | % UF na LMA | Mata 2020 | % mata | dec mata 19-20 | variação do anterior | dec mata 18-19 |
AL | 2.783.066 | 1.523.382 | 55% | 142.746 | 9,40% | 7 | ||
BA | 56.476.046 | 17.988.591 | 32% | 1.991.644 | 11,10% | 3.230 | -9% | 3.532 |
CE | 14.889.445 | 866.840 | 6% | 63.489 | 7,30% | 42 | 65% | 25 |
ES | 4.607.445 | 4.606.378 | 100% | 482.260 | 10,50% | 75 | 462% | 13 |
GO | 34.024.282 | 1.190.894 | 4% | 31.177 | 2,60% | 7 | 61% | 5 |
MG | 58.651.394 | 27.621.839 | 47% | 2.814.998 | 10,20% | 4.701 | -3% | 4.852 |
MS | 35.714.708 | 6.386.440 | 18% | 688.021 | 10,80% | 851 | 127% | 375 |
PB | 5.646.724 | 599.370 | 11% | 54.571 | 9,10% | 85 | ||
PE | 9.806.788 | 1.689.578 | 17% | 192.309 | 11,40% | 38 | -52% | 79 |
PI | 25.175.549 | 2.661.852 | 11% | 899.643 | 33,80% | 372 | -76% | 1.558 |
PR | 19.929.898 | 19.635.642 | 99% | 2.314.954 | 11,80% | 2.151 | -22% | 2.767 |
RJ | 4.375.042 | 4.375.042 | 100% | 819.868 | 18,70% | 91 | 106% | 44 |
RN | 5.280.960 | 350.839 | 7% | 12.136 | 3,50% | 14 | ||
RS | 26.863.785 | 13.845.176 | 52% | 1.083.234 | 7,80% | 252 | 73% | 146 |
SC | 9.573.069 | 9.572.179 | 100% | 2.183.862 | 22,80% | 887 | 25% | 710 |
SE | 2.193.819 | 1.021.622 | 47% | 69.100 | 6,80% | 117 | -16% | 139 |
SP | 24.821.948 | 17.071.791 | 69% | 2.341.618 | 13,70% | 218 | 402% | 43 |
TOTAL | 340.813.966 | 131.007.456 | 38% | 16.185.632 | 12,40% | 13.053 | -9% | 14.375 |
Acesse o Atlas da Mata Atlântica 2019-2020
O levantamento é realizado pela Fundação SOS Mata Atlântica em parceria com o INPE/MCTI, por meio de imagens de satélite e tecnologias na área da informação, do sensoriamento remoto e do geoprocessamento. O projeto é fruto de um acordo de cooperação técnica pioneiro, estabelecido em 1989, voltado a determinar a distribuição espacial dos remanescentes florestais e de ecossistemas associados da Mata Atlântica, monitorar as alterações da cobertura vegetal e gerar informações permanentemente aprimoradas e atualizadas desse bioma.
“Os avanços tecnológicos na área da informação, do sensoriamento remoto, do processamento de imagens de satélites e da geoinformática vêm contribuindo favoravelmente para a realização do Atlas, tornando-o mais preciso e detalhado, além de mais acessível ao público em geral”, afirma Silvana Amaral, coordenadora técnica do Atlas da Mata Atlântica pelo INPE.
Todos os dados também estarão disponíveis no aplicativo www.aquitemmata.org.br, com mapas interativos e gráficos que trazem a informação atualizada sobre o desmatamento e o estado de conservação de florestas, mangues e restingas nos 3.429 municípios da Mata Atlântica.
Mapa dos remanescentes de Mata Atlântica em Santa Catarina. Fonte: Atlas da Mata Atlântica 2019 – 2020.
Fonte: SOS Mata Atlântica.
Foto: área desmatada em Santa Terezinha (SC), por Carolina Schäffer.