Por Gisele Victor Batista, coordenadora de mobilização do Movimento Nacional ODS Santa Catarina
Conhecendo o ODS 18
O ODS 18 – Igualdade Étnico-Racial é uma iniciativa inovadora e voluntária do Brasil.
Ele busca, até 2030, o desenvolvimento sustentável, combatendo o racismo. Sua missão é: acabar com a discriminação étnico-racial no trabalho; extinguir a violência contra indígenas e afrodescendentes; garantir o acesso ao sistema de justiça para negros e indígenas; e assegurar saúde, educação de qualidade e habitação segura.
A consolidação do ODS 18 ganhou impulso com a criação da Comissão Nacional dos ODS (CNODS), através do Decreto 11.704/2023, que é composta paritariamente por 84 membros de entidades governamentais e da sociedade civil. Dentro dessa estrutura, foi estabelecida a Câmara Temática para o ODS 18, que é dedicada a aprofundar o diálogo e formular estratégias específicas para combater as desigualdades raciais no Brasil.
A articulação para a proposta do ODS 18 já mobilizou diversas instituições nacionais, incluindo o BNDES, o Ministério da Igualdade Racial (MIR), o Ministério da Previdência e Inclusão (MPI), o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC). Embora específico ao Brasil, o ODS 18 serve para destacar que a sustentabilidade e a justiça social são indissociáveis e que o combate ao racismo deve ser uma prioridade declarada nas agendas de desenvolvimento global e local.
A Importância Socioeconômica do ODS 18: Ampliando a Inclusão na Agenda de Sustentabilidade
O relatório “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil” do IBGE revela que, apesar de constituírem uma maioria populacional (55,5%), os grupos pretos e pardos estão entre os mais afetados pela pobreza, pela informalidade no mercado de trabalho, pela insegurança habitacional e pelo racismo ambiental. A população negra enfrenta maiores desafios no mercado de trabalho. Ela representa 72,9% dos desempregados no país.
Em termos de distribuição de riqueza, um relatório da Oxfam (2024) aponta que 63% da riqueza nacional está concentrada nas mãos de apenas 1% da população, enquanto os 50% mais pobres detêm apenas 2% do total do patrimônio. Essa desigualdade resulta em abismos sociais profundos, especialmente quando 73% dos indivíduos em extrema pobreza no Brasil são negros (IBGE, 2022).
A situação torna-se mais alarmante quando se trata dos povos originários. Segundo o IBGE (2022), o Brasil registra 1,7 milhão de indígenas (0,83% da população nacional), mas este grupo enfrenta inúmeras desigualdades e restrições que perpetuam ciclos de pobreza e exclusão e que impactam a qualidade de vida e a preservação de ambientes naturais. Em 2021, houve 305 casos de invasões, exploração ilegal e danos em 226 terras indígenas, em 22 estados brasileiros.
A educação é outra área crítica: a taxa de analfabetismo entre os indígenas é de 23,3%, enquanto a taxa entre não negros é de 2,4%. Além disso, o preconceito e a discriminação continuam a ser uma triste realidade, pois um relatório do Exame apontou que um em cada cinco brasileiros manifesta preconceito contra os indígenas.
Esses dados destacam a necessidade urgente de políticas públicas mais eficazes e de ações concretas para proteger os direitos das populações indígena e afrodescendente, a fim de integrá-las de maneira mais justa e equitativa no tecido socioeconômico brasileiro. A luta pela igualdade étnico-racial, tema central do ODS 18, inclui esforços específicos e dedicados para abordar as disparidades que afetam essas populações, reafirmando que o compromisso com o desenvolvimento sustentável deve englobar todos os cidadãos, independentemente da cor de sua pele ou de sua origem cultural.
Conhecendo as Metas do ODS 18
O ODS 18 tem como principal objetivo eliminar o racismo e a discriminação étnico-racial, em todas as suas formas, contra os povos indígenas e afrodescendentes. Ainda em fase de construção e validação, apresenta as seguintes metas preliminares:
1. Eliminar o racismo e a discriminação, tanto direta quanto indireta, bem como nas formas múltiplas ou agravadas, e a intolerância correlata contra os povos indígenas e afrodescendentes nos ambientes públicos e privados de trabalho.
2. Eliminar todas as formas de violência contra povos indígenas e afrodescendentes nas esferas pública e privada, levando em conta suas interseccionalidades, em particular o homicídio das juventudes, feminicídio e os resultados da homofobia e da transfobia.
3. Garantir aos povos indígenas e afrodescendentes a efetivação e a ampliação do acesso à justiça, o devido processo legal e tratamento digno, justo e equânime perante os sistemas de justiça e de segurança pública.
4. Garantir a representatividade equitativa dos povos indígenas e afrodescendentes nas instâncias, colegiados e órgãos do Estado e no quadro de pessoal de empresas públicas e privadas, levando em conta a interseccionalidade.
5. Promover a reparação integral das violações socioeconômicas e culturais, das perdas territoriais e dos impactos ambientais nos territórios dos povos indígenas e afrodescendentes, especialmente os integrantes de comunidades tradicionais, favelas e comunidades urbanas, garantindo o direito à memória, verdade e justiça. 5a: Proteger o patrimônio cultural, artístico e religioso dos povos indígenas e afrodescendentes, garantindo-lhes os recursos necessários para o resgate, preservação e reconhecimento das memórias e das histórias de seus ancestrais e para o desenvolvimento de linguagens artísticas plurais nos territórios onde vivem. 5b: Preservar as formas de vivência e convivência estabelecidas pelos povos indígenas e afrodescendentes, bem como sua cosmovisão, liberdade de expressão cultural e religiosa.
6. Assegurar moradias adequadas, seguras e sustentáveis aos povos indígenas e afrodescendentes, incluindo comunidades tradicionais, favelas e comunidades urbanas, com garantia de equipamentos e serviços públicos de qualidade, com especial atenção à população em situação de rua.
7. Assegurar o acesso à atenção à saúde de qualidade, não discriminatória, para os povos indígenas e afrodescendentes, bem como o respeito às suas culturas e saberes ancestrais, garantindo o fortalecimento do sistema público de saúde.
8. Assegurar a educação de qualidade e não discriminatória aos povos indígenas e afrodescendentes, bem como o respeito às suas culturas e histórias, garantindo o fortalecimento da educação pública.
8a: Garantir o respeito à diversidade linguística, com o estabelecimento de políticas linguísticas por parte do Estado, que assegurem o reconhecimento, o uso, o registro, a preservação, a vitalização e a revitalização das línguas dos povos indígenas e afrodescendentes.
8b: Assegurar a inclusão obrigatória de ações de educação antirracista e sobre as culturas e histórias dos povos indígenas e afrodescendentes, por meio de currículos e estratégias formativas em todos os níveis educacionais.
9. Garantir, na exploração econômica e comercial de bens genéticos e na execução de grandes obras e empreendimentos em territórios historicamente ocupados por essas populações, a implementação de processos de consulta livre, prévia e informada a povos indígenas e afrodescendentes, assim como a repartição de benefícios, quando aplicável, preservando a sua ampla autonomia e autodeterminação.
10. Eliminar a xenofobia e assegurar que todas as metas anteriores, quando cabíveis, sejam refletidas também no tratamento de imigrantes indígenas e afrodescendentes.
O ODS 18 e os Princípios do Pacto Global
O ODS 18, apesar de ser uma iniciativa voluntária focada na igualdade étnico-racial, se alinha com os 10 Princípios do Pacto Global da ONU, que visam integrar os ODS nas agendas de sustentabilidade das organizações. No âmbito dos Princípios 1 e 2, o ODS 18 pode ajudar na eliminação das discriminações e violações dos direitos humanos e promover uma sociedade mais justa e inclusiva.
Nos Princípios 3, 4 e 5 que tratam da abolição do trabalho forçado, erradicação do trabalho infantil, eliminação da discriminação no emprego e no trabalho, e o respeito à liberdade de associação e ao direito à negociação coletiva, o ODS 18 reforça esses princípios buscando erradicar as disparidades socioeconômicas que afetam desproporcionalmente as comunidades indígenas e afrodescendentes.
Os Princípios 7, 8 e 9 podem ser atendidos com o ODS 18 através da promoção da responsabilidade socioambiental e da preservação de ambientes naturais, especialmente para comunidades indígenas e quilombolas, ajudando a promover as terras e o modo de vida dessas comunidades. Por fim, o Princípio 10 coopera para o ODS 18 com o combate à corrupção que acentua as desigualdades e contribui para a vulnerabilidade de populações, como as indígenas e afrodescendentes.
Curiosidade: a ideia de expandir os ODS para incluir objetivos específicos de relevância nacional não é exclusividade do Brasil. A Índia criou o ODS 18 com foco no empoderamento local e no desenvolvimento rural, e a Costa Rica adotou o ODS 18 visando à felicidade e ao bem-estar das pessoas como um ODS adicional. Essas iniciativas refletem um entendimento compartilhado de que os desafios de cada comunidade exigem soluções locais, mesmo dentro de uma estrutura global, como a Agenda 2030.
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Fontes de pesquisa: https://www.gov.br/igualdaderacial/pt-br/assuntos/ods18
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/35467-pessoas-pretas-e-pardas-continuam-com-menor-acesso-a-emprego-educacao-seguranca-e-saneamento#:~:text=Destaques,pardos%20(38%2C4%25). https://www12.senado.leg.br/noticias/infomaterias/2023/04/19-de-abril-povos-indigenas-lutam-por-mais-visibilidade-e-valorizacao#:~:text=Foram%20registrados%2C%20em%202021%2C%20305,terras%20ind%C3%ADgenas%2C%20em%2022%20estados.
