Mais da metade de pessoas que atuam em conselho de administração ou conselho consultivo sinalizaram que suas organizações não estabeleceram a meta net zero para a emissão de gases do efeito estufa e nem estão alinhadas ao compromisso de atingir a meta de limitar o aumento da temperatura global a 1,5ºC.
O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), em parceria com o Chapter Zero Brazil, realizou a pesquisa “Board scorecard: a atuação dos conselhos frente aos impactos climáticos e à estratégia net zero”. Dentre outros importantes diagnósticos, 58,6% dos respondentes reportaram que as organizações não estabeleceram metas para redução das emissões de carbono.
Objetivo do estudo foi compreender como os conselhos, tanto os de administração quanto os consultivos, têm tratado o tema. Capítulo brasileiro da Climate Governance Initiative (CGI), o Chapter Zero Brazil foi lançado pelo IBGC em 2021, justamente com o propósito de estimular e contribuir para a abordagem da agenda do clima nos negócios.
A pesquisa baseou-se no Board scorecard, ferramenta do Chapter Zero no Reino Unido. São 20 questões, cujo objetivo é indicar o grau em que os conselhos empresariais estão respondendo aos desafios das mudanças climáticas e da transição à estratégia net zero, que visa eliminar as emissões de gases de efeito estufa até a metade do século.
O questionário foi estruturado em quatro áreas temáticas: “liderança”, “propriedade”, “estratégia” e “mensuração”. Ouviram-se conselheiros de administração, consultivos e fiscais, bem como diretores executivos (C-level). Amostra da pesquisa contou com a participação de 104 respondentes. Dentre os entrevistados, estão conselheiros de administração (41,3%), conselheiros consultivos (19,2%), conselheiros fiscais (8,7%) e diretores executivos (30,8%).
Resultados
Bloco Liderança -Objetivo foi garantir que o conselho esteja informado, preparado e pronto para impulsionar mudanças e se responsabilizar pelo estabelecimento de uma estratégia net zero. Evidenciou-se que há ainda muito a avançar nesse quesito. Os resultados demonstraram que pautar a temática pelo menos quatro vezes ao ano não é uma prática adotada pelos conselhos/organizações, conforme apontaram 52,9% dos respondentes. Também há falhas na comunicação e divulgação da importância de se cumprir a meta climática estabelecida para a organização, na visão de 49% dos respondentes.
Ainda no Bloco Liderança, 50,9% dos respondentes sinalizaram que os comitês de assessoramento não levam em consideração as mudanças climáticas em suas discussões. Ademais, ressalta-se o fato de que, para 40,4% dos entrevistados, não há clareza sobre a responsabilidade do conselho e da equipe executiva pelas decisões de redução de emissões de gases de efeito estufa, ao passo que 19,2% sinalizaram uma posição de neutralidade com relação a essa questão.
Bloco Propriedade – Aqui, o propósito foi aquilatar quanto o conselho é responsável pelo engajamento, governança e por impulsionar as mudanças para atingir as metas climáticas. Os resultados indicaram a necessidade de maior mobilização por parte dos conselhos diante do tema, pois 65,4% dos respondentes reportaram que essas metas não são incorporadas aos incentivos e à remuneração dos executivos de maneira significativa e mensurável.
Além disso, 43,3% dos respondentes afirmaram que a questão climática não está incorporada na avaliação de riscos e oportunidades e na estratégia central dos negócios. Soma-se a isso o fato de que 14,4% dos entrevistados apresentaram posição de neutralidade quanto à questão. As respostas também evidenciaram que a responsabilidade pelos dados e informações sobre mudanças e metas climáticas não é de todos os departamentos e segmentos da organização, por vezes se limitando à área de sustentabilidade ou a uma específica, de acordo com 48,1% dos respondentes. Ainda nesse quesito, 17,3% apresentaram postura de neutralidade.
Também no Bloco Propriedade, chama a atenção o fato de as empresas não garantirem que as habilidades e os recursos necessários estejam disponíveis para cumprir sua ambição climática, conforme a visão de 45,2% dos respondentes, contra 33,6% dos que sinalizaram que as organizações têm garantido a disponibilidade dessas habilidades e recursos.
Por fim, para 50% dos entrevistados não há um plano de trabalho abrangente que envolva toda a força de trabalho na visão sobre o tema e nas mudanças necessárias nas organizações. Soma-se a isso o fato de que 17,3% apresentaram postura de neutralidade ante o tema.
Bloco Estratégia – Visou desenvolver e avaliar estratégia, planos e recursos em vigor para reduzir as emissões de carbono e promover adaptação às mudanças climáticas, bem como incorporá-las à estratégia geral de negócios e ao objetivo da organização. Novamente, os resultados apresentados são críticos e evidenciaram que o tema não tem sido priorizado pelos conselhos.
Quando questionados se o conselho analisou a estratégia dos negócios considerando pelo menos dois cenários de mudanças climáticas, 58,6% dos respondentes sinalizaram que não, ao discordarem da proposição. Nessa mesma linha, 58,6% reportaram que o conselho não estabeleceu a meta net zero para a emissão de gases do efeito estufa, nem está alinhado ao compromisso de atingir a meta de limitar o aumento da temperatura global a 1,5 grau.
Ainda em Estratégia, 57,7% dos respondentes pontuaram que a ambição quanto ao tema não se traduz em metas de curto prazo ou em um plano de ação de cinco anos. Impactos físicos decorrentes das mudanças climáticas também não são considerados pelos conselhos, de acordo com 53,8% dos respondentes.
O bloco encerra-se com 60,6% dos entrevistados declarando que o conselho em que atuam não considera a questão climática em todas as decisões de investimento, nem faz uso de uma ferramenta de quantificação, como a de precificação de carbono. Nessa questão, 16,3% apresentaram uma postura de neutralidade.
Bloco Mensuração – Buscou entender e avaliar as emissões de carbono da organização, reduzindo a pegada, revisando e comunicando os progressos e impactos. A tendência em termos de resultados assemelhou-se aos demais blocos, evidenciando que tanto empresas quanto conselhos não têm se dedicado ao compromisso de transição para a estratégia net zero, nem aos impactos decorrentes das mudanças climáticas.
Para 30,7% dos respondentes, a empresa em que atuam avalia os impactos da transição net zero em todas as suas operações e decisões de investimento, de acordo com os escopos 1 e 2 estabelecidos pelo GHG Protocol No entanto, 51,9% dos respondentes discordaram dessa afirmação.
Ainda quanto ao GHG Protocol (pacote de padrões, orientações, ferramentas e treinamentos para que empresas e governos mensurem e gerenciem as emissões responsáveis pelo aquecimento global, criado por uma parceria entre o World Resource Institute e o World Business Council for Sustainable), o tema parece ser desconhecido por empresas e seus conselhos: 59,6% dos respondentes sinalizaram que a organização em que atuam não tem suas emissões enquadradas no escopo 3 do GHG Protocol e não possui uma abordagem específica que cubra todos os produtos e serviços.
Observou-se, também, que medidas de curto e de longo prazo alinhadas a planos de redução de emissões de gases de efeito estufa e à sua revisão regular não são objeto de acompanhamento pelo conselho, na visão de 57,7% dos respondentes. Divulgar a ambição climática, os planos de ação e o progresso dessas ações com base em métodos e métricas científicas não é uma prática das empresas, na opinião de 55,8% dos entrevistados. Nessa questão, 14,4% apresentaram posição de neutralidade.
Sobre o IBGC
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Texto: Mônica Garcia